Mas ele conseguiu dar uma desculpa para no domingo escolher o presente. Achou estranho ela não ter ficado chateada, fazendo muitas perguntas, questões, investigando porque o danado quer ficar longe logo no domingo. De tão desconfiado ele é quem começou a perguntar, se ela ficaria bem, se ia sair com as amigas, almoçar com a irmã, pajear os sobrinhos. Respostas escorregadias de ambos combinam em se telefonar à noite.
Em shoppings diferentes, ambos foram comprar os presentes do dia dos namorados. Último domingo antes da data importante, estacionamento, escadas, elevadores, corredores e atendentes, tudo acima do limite do tolerável. E a dúvida em o que dar. Não é fácil enamorados se presentear. Se o presente for um objeto já pode sinalizar que vem casório por aí. Se errar no gosto pessoal é porque não gosta, não sabe o que o outro quer. E se o presente indicar uma futura ausência então, azeda o mês todo.
Nosso casal sobrevive à compra, agora é a ansiedade de esperar dois dias para saber o resultado. A prova de fogo é o telefonema à noite, onde cada um sabe o que outro foi fazer, mas não quer estragar a surpresa. É uma verdadeira batalha segurar. É melhor não se verem até o dia 12. Segunda-feira, dia onze, é um dia de poucos encontros mesmo. Vai passar rápido.
Chegou o dia e antes mesmo do despertador o telefone toca: Bom dia meu amor, feliz dia dos namorados, eu te amo, você é minha vida, não vivo sem você. Não é preciso definir quem ligou para quem. Ambos fizeram isso, afinal, é o Dia. Durante o trabalho, aquele friozinho no coração, não vê a hora de largar o batente e cair nos braços, trocar aquele beijo quente e de entrega. Fazer mais.
Por volta das 19 horas conseguem se livrar da labuta. Trânsito e sem planos, resolvem jantar num lugar aconchegante. Não se combinam neste ponto. O dinheiro não é problema, podem pagar o melhor restaurante de São Paulo. Mas ele quer massa e vinho e ela quer manter o regime e a abstinência. Como o dia é de trégua, optam por um peixe, mas com luz de velas.
A fila já começa pelos valets. Tem senha para poder entregar o carro. Todos os casais da cidade resolveram vir neste lugar. Ela retoca a maquiagem a cada 5 minutos, acendendo a luz interna e apagando, entre um cigarro e outro. Ele presta atenção no rádio, no retrovisor, na vez e no relógio. Buzinas e motores acelerando. Uma família exaltada espinafra a fila dupla que entope a fluência do trânsito. Não há nada de romântico no ar.
Na fila da porta de espera do restaurante, na calçada, mais uma constatação: vai demorar para sentar e ficar se entreolhando. É uma carreira de casais abraçados, tentando manter um mínimo de calma, em meio ao trânsito de carros e pedestres que assistem ao circo. Nem uma cortesia do restaurante, estamos ao frio, pelo menos não há garoa e o céu de São Paulo está deslumbrante.
São 23 de horas quando nosso casal consegue um lugar à mesa. É um canto fora da janela, na ala de fumantes e passagem dos garçons. Não há o vinho que se quer, mas o que restou.
Edman Izipetto
12/06/2007
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