sábado, 31 de dezembro de 2011

Caminhando para 2012

            Às portas do último ano da humanidade – vou provar que os Maias estão certos – é curioso observar como as pessoas ficam mais afáveis nesta época do ano, desde que não sejam aquelas chatas que resolvem fazer despesa do mês hoje, ou pagar conta na fila da casa lotérica, onde a maioria sonha com a Mega da virada, virada de plano, de calendário, de taça...
            Primeiro a caminhada pelo sobe e desce do meu bairro, com poucos carros pelas ruas, mas muita gente no portão lavando a sujeira de um ano inteiro para começar o novo zerado. Vizinhos que não se cumprimentam o ano todo trocam notícias, receitas ou disputam vantagens. Crianças entram no jogo ao comparar seus brinquedos, que o Noel que não tem preço (mas para todas as outras coisas sim) lhes deixou sob a árvore de plástico com pisca led.
            Eu sou do tempo de cumprimentar as pessoas, pedir por favor, e outras atitudes dinossáuricas, que o meteoro da tecnologia e modernidade está extinguindo. Falando o português claro, esta geração é bem da mal educada. Mas eu não dei conta de retribuir tantos sorrisos e felicitações das pessoas que conheço de vista, e das que nunca vi mais gordas. E olha que meu bairro é peso pesado.
            E por falar em balança, o delicioso aroma de assados torna a caminhada em prol da saúde um passeio pelas delícias da gula, inundando minha boca de água, em que pese, sem trocadilho, a garoa que chora pelos lados da Serra do Mar. Cheiros de temperos, carnes e perfumes de flores comestíveis, que se misturam neste ritual de passagem. Dá para fazer um seriado de Babet’s party.
            São Silvestre já está no alongamento, mas sabemos todos que os quenianos devem ganhar mais uma. Fugir de gueopardos lhes dá o condicionamento necessário para tanto. Nossa onça não é lá muita adepta de corridas, preferindo a tocaia e o bote certeiro. Não sei por que deram ao leão a representação do imposto de renda, nosso felino seria muito mais apropriado.
            E 2012 vai ter muitos feriados prolongados. Um político do Olimpo de Brasília está com a idéia fixa de transferir, numa canetada, estas datas que caem no meio da semana, para segunda-feira, e assim evitar a emenda “meia nove”. Porque o País não pode parar... Para ilustríssimo, trabalho é apertar parafuso ou digitar números, esquecendo que a única coisa que para nestes feriadões é o trânsito das estradas.
            As cidades turísticas e a indústria do entretenimento, nos delírios cerebrais do preocupadíssimo representante do povo, não entram na estatística do PIB, e os trabalhadores só devem descansar ou passear nas suas férias anuais. Lembremos que a semana deles, políticos, é de terça a quinta, com dois recessos por ano, fora as fugidas para Carnaval, festas juninas e eleições, sem nenhum prejuízo das gordas remunerações a que se deram ao direito.
            O ano que chega é bissexto, teremos um dia a mais para comemorar o gnocchi da sorte, 29 de fevereiro, e no primeiro dia entra a Lua crescente. Os moradores de Juazeiro, na Bahia, e Petrolina, em Pernambuco, por conta do horário de verão, vão ter duas festas de réveillon separadas apenas pelo Rio São Francisco. E por que o mundo acaba em 2012?
            Os brasileiros são os que mais gastam nos EUA, em New York já tem até informações turísticas em português. Os pop stars não estão mais esperando a aposentadoria para se apresentar por aqui. O time da marginal sem número, em vias de assentamento para a última estação do metrô, disputará a terceira Libertadores seguida, recorde em 100 anos. O FMI pediu grana emprestada para nós. A China vai liberar visitações na cidade proibida. O El Niño já está chegando à adolescência. As psicografias já podem ser feitas por Ipods (deve ser coisa do Jobs, ele não descansa).

Edman Izipetto
Um ótimo 2012 para todos, espero estar junto até o fim dos tempos.
31/12/2011

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Entre as festas

            É como a quarentena no deserto do ócio. Os sete dias que separam o Natal do Réveillon são um suplício para quem está trabalhando, para quem não está, e para quem precisa que os outros trabalhem.
            Você que ganhou o prêmio de funcionário do mês, não podia dizer não ao chefe. Realmente é um reconhecimento e tanto vir sozinho nesta semana morna, mas você está com a honra de ficar com a chave, abrir o escritório, sempre pode haver uma correspondência importante. E não tem trânsito mesmo, mas o que importa isto se para você o ônibus não vem vazio e demora mais para passar, pois os donos da empresa também acham que ninguém trabalha nesta semana. E vai comer resto do Natal porque os restaurantes entraram em férias coletivas.
            E você, que pensou que ia botar bermuda e chinelo de dedo, tua parceira já fechou toda a sua agenda. Primeiro os consertos: torneiras pingando, chuveiro espirrando, chave elétrica caindo, telhas trincadas, se bobear vai querer pintar a casa toda... E você, dentro da ressaca normal desta semana, com toda aquela vontade de quem não acordou ainda, vai procurar a caixa de ferramentas para evitar curto circuito em casa. E num misto de alegria contida em euforia, descobre que teu cunhado levou tuas melhores ferramentas e os acessórios para pequenos consertos.
            É a deixa para sair de casa, quebrar a rotina que você não projetou e, quem sabe, encontrar um conhecido para uma conversa de tremoços e cerveja. Mas a clarividência feminina é infalível. Ela vem com uma lista pronta de supermercado, já que você vai sair, já que vai tirar o cartão do bolso, já que... Você faz qualquer coisa para conseguir um álibi. Na tua cabeça, compra o mínimo no comércio local e tira o resto do dia para vadiar.
            O comércio local está aproveitando a semana para reformar. Acreditando que é só no seu bairro, vai ao próximo e é a mesma coisa. Agora você entende um pouco o que quer dizer crescimento econômico. A contra gosto, segue para um centro de compras mais complexo e já começa a sentir o drama na entrada, com fila para estacionar – quero minha semana de folga – e os apressadinhos querendo lhe furar a vez. O Natal já não passou?
            Acha que era só para trocar presentes? Parece que todos resolveram praticar bricolagem. Precisou disputar o último rolo de veda rosca, a fita isolante teve que ser Pink e as ferramentas, bendito cunhado, só havia os conjuntos completos, caríssimos e fora de questão por hora. A meia dúzia de telhas vai ter que esperar, muito embora o vendedor tenha lhe tentado empurrar outro modelo garantindo que dava certo.
            Seu primeiro dia de folga já está anoitecendo, você não almoçou e ainda tem que encarar o supermercado. Os caixas estão com filas intermináveis, com famílias inteiras se abastecendo para seguir viagem. A praça de alimentação parece um acampamento de desabrigados, com restos de embalagens e marcas de mostarda e catchup entre os banquinhos.
Vai no balcão mesmo, entre tapas e resmungos consegue pedir um chope e um pastel “frito na hora” que a atendente retira da vitrine aquecida. Massa emborrachada (daria um ótimo veda rosca) e a bebida, morna, choca e quase transparente. Será que se eu pedir um café ele virá gelado? Que o Réveillon chegue logo para tudo voltar ao normal, eu pegando trânsito para apenas ir trabalhar.

Edman Izipetto
29/12/11

sábado, 24 de dezembro de 2011

O último Natal da humanidade...

... do ano de 2011 começa hoje.

Tem muita gente que gosta, algumas se entristecem e poucas, muito
poucas, detestam. Assim como não se explica a euforia, o oposto também
não tem razão. A única verdade do Natal é que era uma festa pagã
ligada ao sostício de inverno, quando as noites são mais longas no
hemisfério norte, daí a tradição de se enfeitar de luzes, comer
exageradamente e botar o pé no barril (lá não tem jaca, a jaca é
nossa).
A igreja tentou combater o "paganismo" e se apropriou da data,
inventando o nascimento de Jesus próximo ao sostício; é o pegaram para
Cristo porque não há registros que garantam que ele tenha nascido
neste ou em qualquer outro dia. Tanto que a crucificação não tem dia
certo, é uma sexta-feira...Mas a idéia da Igreja não deu muito certo
e, quando houve a reforma protestante, a idéia de Natal foi abolida.
Hoje temos uma festa pagã com princípios cristãos, porque nesta época
é que ocorrem grandes manifestações de amor ao próximo e distribuição
de presentes. Aliás, o Noel é uma invenção de dois novaiorquinos, lá
pelos tempos da revolução industrial. Os protestantes da nova
Inglaterra, sabendo da origem das festas Natalinas, tentaram proibi-la
da colônia. Não sei os nomes, mas um inventou a história de St Klaus,
com a distribuição de presentes (um papa de nome Nicolau tinha o
costume de presentear), principalmente porque criança antes não era
vista como tal, e sim como mão de obra barata, e outro, ilustrador,
desenhou o Noel como o vemos hoje, e foi o mesmo ilustrador que criou
a figura do Tio San e os bichos dos dois partidos políticos de lá.
Hoje Noel é mais lembrado que a pseudo data natalina, mas ainda bem
que os princípios pagãos persistiram, porque ia ser muito chato jejuar
num dia como este.
E para nós, aqui no hemisfério sul dos trópicos, é verão, os dias são
mais longos que as noites, no máximo cai granizo e nossa lenda mais
apropriada seria um saci, apenas de sunga, escondendo presentes aqui e
acolá. E temos jaca para poder por o pé, já que, segundo os Maias,
este é o último Natal da humanidade.

Ho, Ho, Ho, Feliz Natal, e sigo na minha canoa puxada por oito botos cor-de-rosa

domingo, 11 de dezembro de 2011

Prós e contras de ir à Gonçalves

Lugares “novos” sempre atiçam, e quando estão na moda então...parece que você não tomou banho se desconhecer o lugar, e aparece tatuado na testa que “não estive lá”. Mas estamos em outros tempos, politicamente corretos ou não, você não pode simplesmente ir a um lugar, tem que participar.

Caso você seja um predador da natureza, isto mesmo, predador, não vá à Gonçalves, Minas Gerais, Sul. Lá é uma das últimas reminiscências das florestas de araucárias do mundo, se você não souber o que a última frase quis dizer, estude uns 6 anos antes de ir...

Mas não é só isso. Lá também tem resquícios de mata atlântica de altitude. PQP, o que é isto? Não é mato que tenha atitude É a Mata Atlântica que, inicialmente os portugueses, e depois os brasilianos, dizimaram, mas que é a responsável de quase toda a água que brota em solo brasileiro. Acreditem, a água é o petróleo de amanhã...

Voltemos ao turista pret a port. Você recicla seu lixo? Você usa seu carro racionalmente? Sabe o que é usar o carro racionalmente? Você escuta o seu som de maneira que ninguém saiba teu péssimo gosto? Você deixa rastros de plásticos por onde anda? Você carrega suas neuras na bagagem da sua SUV? Vá para a PQP, mas não para Gonçalves...

Porque lá ainda existem olhos d’água. E águas não brotam de calçamentos ou pastos, brotam de florestas. Daquelas bem antigas, de meio metro de folhas secas se decompondo no seu tempo de existir. Nem antes, nem depois.

Deixe suas grifes na cidade, dispa-se de seus preconceitos. Gonçalves acolhe as diferenças, de altitude, de atitude, de desafenças. Não há espaço para radicalismos em Gonçalves, porque a natureza engole naturalmente o que é demais em suas névoas eternas e intangíveis, silenciosamente.

Por favor, não leve seu som, seja ele 78 rpm ou MP3. Harmonize-se com o pio do gavião, a fanfarra dos periquitos ou a algazarra das siriemas. Se quiser ouvir barulho, continue onde está, não se desperdice subindo a serra porque os melhores lugares de ouvir o que você consegue estão ai, onde você está. Aqui o silêncio é uma ópera...

E se você é daqueles que come qualquer coisa, continue onde está. Não saberá apreciar os Sabores da Mantiqueira, não entenderá a proposta da Kitanda, não pensará o que é degustar os pratos do Chiquinho, do Toninho ou da Vilma, ou o risoto de pinhão do Demeter na Roça. Ou a prosa etílica no Bar do Marcelo. Tem mais coisa, lógico que tem, você achou que eu ia entregar o tabuleiro de mão beijada? Tem a feira dos Orgânicos da Mantiqueira, aos sábados, a partir das 8h.

Se você quer consumir, vá para outro lugar, se quiser evoluir, vá para Gonçalves.