terça-feira, 30 de dezembro de 2003

Sobre o escrever (verbo, não a poesia)

As inscrições ruprestes comprovam que foi com a imagem, e não com palavras, que a humanidade começou a se comunicar. Hoje as imagens valem mais do que palavras e quem inventa o grunhido “da hora” é deus (este é com caixa baixa mesmo). Estaríamos voltando à idade das cavernas?
Minhas viagens virtuais foram possíveis graças a Júlio Verne, Dickens, Balzac, mestre Machado de Assis, Érico Veríssimo, Bandeira, Drumonnd, Baudelaire. Hoje qualquer www te envia tudo prontinho, interativo, hipertextualizado, pasteurizado e homogeneizado. As pessoas estão cada vez menos pensando, refletindo, observando, concluindo, pois basta um clic.
Quem tem o dom de escrever hoje é exceção. Desperdiçar isto não deve ser bem visto por Deus (este é com caixa alta). Poetas não vivem sem paixão, sem estrofes e parágrafos. Viram zumbis. Não importa se alguém vai ler ou não, isto é outra história. Nós (poetas) registramos sentimentos e nem todas as pessoas estão sintonizadas com eles.
Por que isto nos torna vivos? Porque para sugerir metáforas precisamos “trabalhar” nossa sensibilidade, e isto faz com que o pôr do sol de ontem (você viu?) te obrigue a parar o carro, seja onde for, e diga obrigado. Ou que um casal de sabiás, antes misturados a outros sons, sejam pinçados do resto e alegrem um final de domingo. Ou que uma simples fresta de luz iluminando o pó remeta a um Natal cheio de neve. Porque todo poeta é uma criança, e toda criança merece brincar com suas rimas.

Edman Izipetto
30/12/2003